Quando pensamos no combate aos mosquitos sempre lembramos da utilização de produtos como repelentes e inseticidas. Porém, como se determina os riscos que o uso inadequado desses produtos pode causar?
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), quando solicitado o registro de um novo inseticida é necessário que se apresentem análises que comprovem a sua eficácia contra o organismo alvo. Além disso, devem ser apresentadas análises toxicológicas que provem que esse produto é seguro para a saúde humana, dos animais, e que não causa dano ao meio ambiente.
No Brasil, o registro de inseticidas é regulado através da legislação e decretos que tratam sobre agrotóxicos e afins. As principais entidades envolvidas são o Ministério da Saúde (MS), através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e o Ministério do Meio Ambiente (MMA). A Anvisa é responsável por avaliar a toxicidade, o risco à saúde pública e conceder os registros de inseticidas destinados ao uso em ambientes urbanos, sejam eles industriais, domiciliares ou em locais de uso público ou coletivo. O MMA, por sua vez, é responsável por realizar a avaliação da toxicidade e riscos ao meio ambiente e conceder os registros de inseticidas destinados ao uso em corpos hídricos, proteção de florestas nativas e outros ecossistemas. É de responsabilidade do MAPA criar e estabelecer diretrizes para a avaliação de resíduos de agrotóxicos no solo, em produtos de origem animal e vegetal e conceder os registros aos inseticidas de uso agropecuário desde que atendidas as diretrizes e requisitos apresentados pela Anvisa e o MMA. A avaliação e registro de repelentes de insetos para a aplicação na pele é realizada pela Anvisa, sendo classificados como cosméticos.
Mas qual é a importância de avaliar esses riscos?
Verificar a segurança do uso de produtos para proteção contra insetos é importante porque o uso inadequado de repelentes registrados, ou o uso de produtos sem registro ou segurança comprovada podem causar diversos problemas, como a intoxicação (por absorção pela pele, por ingestão ou através da respiração), a irritação e sensibilização da pele e dos olhos, o acúmulo de substâncias tóxicas pelo uso contínuo, disfunções reprodutivas ou até mesmo atrapalhar o desenvolvimento de uma gravidez.
Já para o meio ambiente, é necessário avaliar os riscos e verificar a segurança do uso, pois inseticidas possuem mecanismos de ação que variam. Os inseticidas geralmente apresentam riscos ao meio ambiente, já que afetam diversos organismos, e não apenas aqueles aos quais eles visam afetar. Chamamos de estudos ecotoxicológicos os estudos e pesquisas que investigam os efeitos tóxicos que produtos, sejam naturais ou sintéticos, causam em diferentes organismos e no meio ambiente.
Diversos estudos ecotoxicológicos foram realizados sobre inseticidas de ambiente que têm como principal alvo os mosquitos, principalmente o nosso velho conhecido Aedes aegypti. Natalia Magalhães e colaboradores (2021) encontraram que esses estudos indicam que a maioria dos compostos utilizados como princípios ativos desses inseticidas possuem um certo grau de ecotoxicidade, sendo observada a acumulação desses compostos em diversos organismos, principalmente aquáticos, podendo ocasionar problemas para os ecossistemas nos quais são encontrados, como reduzir populações de insetos aquáticos, afetar a reprodução e a população de microcrustáceos ou o comportamento de répteis.
Já em relação aos estudos ecotoxicológicos sobre os compostos utilizados como princípios ativos dos repelentes de uso na pele, a quantidade de estudos encontrados por Magalhães e col. (2021) é bem menor quando comparada com a quantidade de estudos ecotoxicológicos sobre inseticidas, foram encontrados 32.717 estudos para os compostos presentes em inseticidas de ambiente e 438 estudos para os compostos presentes em repelentes de uso na pele, e os resultados encontrados para o composto mais utilizado como repelente, demonstra um baixo risco ambiental, pois possui uma alta capacidade de biodegradação e são encontrados em baixos níveis em ambientes aquáticos.
Vale ressaltar que os estudos ecotoxicológicos analisados possuíam como objetivo avaliar o risco ambiental para organismos não alvo dos inseticidas e repelentes, sendo eles organismos aquáticos ou terrestres. Os repelentes de uso na pele podem facilmente parar em corpos hídricos e no solo através da água do banho e resíduos da aplicação, e com a baixa quantidade de estudos realizados sobre os compostos presentes nos repelentes quando comparados aos compostos de inseticidas, pode não se ter uma avaliação completa dos riscos dos repelentes para o meio ambiente.
Portanto, podemos compreender os riscos causados pela utilização inadequada de repelentes e inseticidas, visto que seus registros e comercializações são baseados em estudos que determinam a quantidade e a maneira como devem ser utilizados. Também podemos compreender que é necessário que continuem sendo feitos estudos ecotoxicológicos sobre os compostos utilizados como princípios ativos, e que continuem sendo pesquisados novos princípios ativos que afetem cada vez menos o meio ambiente e os organismos que não sejam alvos.
Por Isabela Gonçalves Dias Pereira
Referências
Brasil. Decreto Nº 4.074, de 4 de janeiro de 2002. Regulamenta a lei Nº 7.802, de 11 de julho de 1989, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências. Diário Oficial União. 8 jan 2002.
MAGALHÃES, Natalia Mendes Gomes; SILVA, Raquel Lima e; ESPINDOLA, Laila Salmen. Registro e perfil ecotoxicológico de produtos para controle de Aedes aegypti. Vigilância Sanitária em Debate: Sociedade, Ciência & Tecnologia, [S.L.], v. 9, n. 1, p. 71-81, 26 fev. 2021. Vigilancia Sanitaria em Debate: Sociedade, Ciencia y Tecnologia. http://dx.doi.org/10.22239/2317-269x.01453.